Nos últimos anos, cresce o número de crianças que assumem a identidade de "miniadultos," com agendas lotadas, vestindo-se, maquiando-se e comportando-se como adultos. Esse fenômeno, conhecido como adultização infantil, preocupa especialistas, pois acelera a passagem por fases cruciais da vida, como a infância e a adolescência. Isso coloca as crianças em uma situação desfavorável, já que enfrentam a vida adulta sem estarem psicologicamente preparadas para lidar com seus desdobramentos.
O desenvolvimento cognitivo, que nos permite interpretar e responder adequadamente aos estímulos do mundo ao nosso redor, é construído ao longo da infância, por meio de experiências e vivências. Contudo, a adultização precoce compromete essa base, dificultando a capacidade das crianças de enfrentar desafios futuros. Por estarem em processo de desenvolvimento, acabam por apresentar um amadurecimento físico e psicológico imaturo e incompleto na vida adulta.
A internet desempenha um papel central nesse processo, oferecendo acesso irrestrito à informações e produtos audiovisuais que intensificam os estímulos às crianças. Redes sociais como o TikTok amplificam a adultização ao promover vídeos em que crianças se expõem, dançam ou participam de desafios muitas vezes inadequados à sua faixa etária. A busca por aprovação social e o desejo de se encaixar em padrões estabelecidos por adultos contribuem para a perda de uma infância plena e saudável.

Além disso, crianças submetidas a esse processo tendem a adotar comportamentos e valores adultos, nem sempre positivos. Traços como vaidade, consumismo, erotização e modismo tornam-se comuns, enquanto valores essenciais, como solidariedade e amor, muitas vezes, são relegados a segundo plano. Essa mudança nos valores é frequentemente incentivada por atividades que reforçam a ideia de que agir como adulto é desejável, como festas temáticas em que crianças se vestem e se comportam como adultos, supervalorizando o consumismo e, às vezes, uma maior sexualização. No entanto, é necessário diferenciar esse incentivo claro de valores negativos da inocente brincadeira de vestir-se com roupas dos pais ou maquiar-se com os produtos da mãe. Embora saudável em contexto ocasional, essa prática não deve se tornar recorrente nem reforçar valores centrados na vaidade.
Outros problemas que emergem nesse contexto incluem a superproteção, que impede a criança de lidar com emoções negativas como frustração, e a sobrecarga de atividades extracurriculares, que deixa pouco espaço para brincadeiras e imaginação. É crucial que os pais incentivem o desenvolvimento infantil promovendo atividades lúdicas, estimulando a criatividade, permitindo a liberdade de sentir e fortalecendo os laços afetivos. O ambiente escolar também deve ser um espaço de proteção e apoio, favorecendo o desenvolvimento cognitivo, psicológico e da personalidade das crianças. A ausência dessas experiências durante a infância pode aumentar o risco de estresse e depressão na adolescência.
Outro aspecto preocupante da adultização infantil é a exposição precoce de crianças como influenciadoras digitais, trazendo desafios ao desenvolvimento pessoal e levantando sérias questões éticas. Quando uma criança é colocada em posição de destaque online, ela se torna um produto de entretenimento, sujeita às expectativas e julgamentos de um público vasto e, muitas vezes, desconhecido. Essa exposição pode gerar problemas emocionais, como ansiedade, depressão, baixa autoestima e crises de identidade, especialmente quando o sucesso é medido em números de seguidores, curtidas e visualizações. Além disso, a criança fica vulnerável a comentários maldosos, frequentemente feitos por usuários protegidos pelo anonimato.
A monetização dessa exposição agrava ainda mais a situação. Muitos pais enxergam na fama digital de seus filhos uma oportunidade de lucro, transformando a atividade de influenciador em um negócio familiar. Nesse contexto, o bem-estar da criança frequentemente é colocado em segundo plano em prol do retorno financeiro. A linha entre incentivo e exploração torna-se tênue, especialmente quando a rotina da criança passa a ser dominada por compromissos e contratos que exigem uma carga exaustiva de trabalho, comprometendo sua educação, saúde e bem-estar geral.
O uso comercial da imagem infantil nas redes sociais também compromete a privacidade e segurança, expondo as crianças a riscos potenciais, como contato com indivíduos mal-intencionados. A falta de regulamentação específica para proteger jovens influenciadores agrava o problema, deixando-os vulneráveis a abusos e exploração. Além disso, a pressão constante para criar conteúdo relevante e atrativo pode prejudicar as relações da criança com a família, amigos e escola, gerando um ambiente de cobrança e expectativas irreais.
Referências:
ASSOCIAÇÃO Beneficente dos professores públicos ativos e inativos do estado do Rio de Janeiro. Adultização infantil. [Texto de Blog]. [s.l.], 2023. Disponível em: <https://www.appai.org.br/appai-educacao-revista-appai-educar-edicao-147-materia-de-capa-adultizacao-infantil/>. Acesso em 01 out. 2024.
FIRMINO, Carol. Adultização infantil leva à dificuldade de socialização e baixa autoestima. [Texto de Blog]. [s.l.], 2021. Disponível em: <https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2021/06/02/adultizacao-infantil.htm>. Acesso em: 08 out. 2024.
RIHAPPY. Adultização infantil: afinal, quais são os perigos? Saiba mais! [Texto de Blog]. [s.l.], 2020. Disponível em: <Adultização infantil: afinal, quais são os perigos? Saiba mais! (rihappy.com.br)>. Acesso em 01 out. 2024.
CRIAR e Crescer. Adultização de crianças: a infância descartada. YouTube, 2018. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=ZLLBSutMUwA>.
Comments